Em entrevista ao G1, Vinton Cerf alerta que dados colocados
na web são "inapagáveis", criando desafios para preservação da
privacidade.
Hoje, o
uso da internet não é passível de controle e é impossível manter a privacidade
depois que alguém coloca informações na rede -- uma vez lá, ela nunca mais
sai, por mais que o internauta insista em apagá-la. O diagnóstico é de ninguém
menos que Vinton Cerf, 63, o vice-presidente do Google, que também ostenta o
estranho cargo de Diretor Evangelista da empresa, e é conhecido como pai da
internet.
"Os jovens são muito abertos
à idéia de dividir suas informações on-line", disse Cerf em entrevista ao G1. "Conforme eles forem ficando mais velhos,
podem se arrepender de ter colocado algumas informações e seus pensamentos
jovens na internet. E esses dados podem nunca mais desaparecer, mesmo se forem
retirados dos sites originais.”
O norte-americano recebeu o título não-oficial de “pai da internet” por ter participado da criação do protocolo TCP/IP, que possibilita a conexão entre computadores. Cerf também é conhecido por defender a criação de uma internet interplanetária até 2010. Em projeto realizado junto ao Laboratório de Propulsão a Jato da Nasa, ele trabalha para padronizar protocolos utilizados na comunicação espacial -- isso possibilitaria que as pessoas na Terra recebessem dados de veículos espaciais, como aqueles que exploram Marte.
O norte-americano recebeu o título não-oficial de “pai da internet” por ter participado da criação do protocolo TCP/IP, que possibilita a conexão entre computadores. Cerf também é conhecido por defender a criação de uma internet interplanetária até 2010. Em projeto realizado junto ao Laboratório de Propulsão a Jato da Nasa, ele trabalha para padronizar protocolos utilizados na comunicação espacial -- isso possibilitaria que as pessoas na Terra recebessem dados de veículos espaciais, como aqueles que exploram Marte.
Bem-humorado, Cerf afirma ser apenas um dos
pais da internet. “Os projetos de sucesso têm muitos pais, enquanto aqueles que
fracassam ficam órfãos”, brinca o especialista que também participa da
diretoria da Corporação da Internet para Nomes e Números Designados (Icann, na
sigla em inglês). Em seu currículo constam a Medalha Nacional de Tecnologia
(concedida em dezembro de 1997 pelo presidente Bill Clinton), um prêmio ACM
Alan M. Turing (considerado o “Nobel da Ciência da Computação”, recebido em
2004) e uma Medalha Presidencial da Liberdade (concedida em 2005, pelo
presidente George W. Bush).
A seguir, trechos da conversa que
Cerf teve com o G1 em São Paulo, onde participou na
semana passada do evento Icann Meeting, organizado pelo Comitê Gestor da
Internet.
G1
– O senhor é o Diretor Evangelista de Internet do Google, provavelmente a única
pessoa a ter esse cargo. Pode definir exatamente o que faz?
Vinton
Cerf - Quanto tempo você tem
(risos)? Esse é um título que o Sergey Brin e Larry Page [fundadores do Google]
inventaram e acabou pegando. Eles me perguntaram que título eu queria e disse
que gostava de “arquiduque”, mas então alguém me lembrou que o último
arquiduque foi assassinado na Primeira Guerra Mundial (risos). No Google, eu
tenho a missão de continuar aquilo que venho fazendo nos últimos 30 anos: falo
sobre a construção da internet e incentivo as pessoas a usá-la. Por isso,
ganhei o cargo de evangelista. Passo muito tempo conversando com empresas que
têm tecnologias interessantes, visito centros de Pesquisa e Desenvolvimento do
Google e também vou a universidades para recrutar engenheiros e cientistas da
computação. É uma variedade muito grande de atividades que me mantêm viajando
cerca de 85% do meu tempo. Nunca estou em casa, nem no escritório.
G1
– E não é cansativo falar tanto sobre um mesmo assunto?
Cerf -- Não, porque a internet está sempre mudando. Há sempre novas aplicações, novas idéias, novos modelos de negócio. Gosto muito de falar sobre o assunto, porque nunca é a mesma coisa, há sempre algo novo e fresco. O fato de ter um bilhão de pessoas conectadas à rede indica que um bilhão de pessoas podem ter idéias, elas estão livres para fazer isso sem pedir autorização.
G1 – O senhor consegue acompanhar tantas mudanças?
Cerf -- Não, porque a internet está sempre mudando. Há sempre novas aplicações, novas idéias, novos modelos de negócio. Gosto muito de falar sobre o assunto, porque nunca é a mesma coisa, há sempre algo novo e fresco. O fato de ter um bilhão de pessoas conectadas à rede indica que um bilhão de pessoas podem ter idéias, elas estão livres para fazer isso sem pedir autorização.
G1 – O senhor consegue acompanhar tantas mudanças?
Cerf
-- A internet está mais dinâmica agora e fica mais difícil
de acompanhar. São muitas aplicações, softwares... as pessoas sempre inventam
coisas novas. No início, os textos e imagens eram estáticos. Agora, quando
entramos em uma página, nosso navegador é convidado a puxar um software. De repente,
seu computador está fazendo algo que não sabia como fazer antes, porque baixou
um software. Isso pode ser bom, mas também é ruim. Pessoas mal-intencionadas
podem induzir os computadores dos internautas a fazer coisas ruins, como apagar
informações do disco rígido ou atacar sites. Isso preocupa, porque muitas
pessoas abusam de sua capacidade de controlar um grande número de computadores
para fazer coisas desse tipo. Para encontrarmos o equilíbrio em um ambiente tão
aberto, temos de construir melhores aplicações e melhores sistemas
operacionais, que não sejam dominados tão facilmente. Além disso, podemos
desenvolver defesas contra esse tipo de abuso e punir as pessoas que cometem
esses crimes, com multas e detenções.
G1
-- Falando ainda sobre o aspecto negativo, o que o senhor não gosta na
internet? O senhor criou uma ferramenta bastante útil, mas....
Cerf
-- ... mas as pessoas também a utilizam para fazer o mal. O
spam [mensagens não-solicitadas] é muito irritante. E, em alguns casos, ele
consome recursos caros, principalmente daquelas pessoas que ainda pagam por
minuto para acessar a internet. Os ataques de negação de serviço [com os quais
computadores controlados remotamente tiram sites do ar], por sua vez, são
cruéis. E os problemas encontrados na internet mudaram. Antes eram jovens que
queriam mostrar o que podiam fazer, modificavam o conteúdo de sites, mostravam
caras feias nas páginas invadidas. Hoje há pessoas que são pagas para
interceptar a comunicação de outras. Empresas tentam roubar informações de seus
concorrentes, há a violação dos direitos autorais, difamação, esse tipo de
coisa. Não estou feliz com isso, mas reconheço que é muito difícil controlar
esses problemas se quisermos manter um ambiente tão livre. Temos de aprender a
lidar com esses desafios, mas a solução não é simplesmente acabar com a rede. É
necessário identificar aqueles que destroem e também construir defesas.
G1
-- E o que realmente funciona na internet, aquilo que lhe deixa orgulhoso?
Cerf
-- Podemos comparar o que fiz com a construção de um grande
sistema rodoviário. Eu não desenvolvi os carros. Outras pessoas fizeram isso e,
conforme seguiram as regras desse sistema rodoviário, foram criando novos
serviços: o posto de gasolina, a loja de conveniência. Levando isso para o mundo
da internet, minha estrada ajudou a construir um sistema de transportes,
padronizá-lo e convencer as pessoas de que deveriam usá-lo. Fico orgulhoso em
saber que esse é um fenômeno mundial e acessível para um número muito grande de
pessoas.
G1
-- Mas conforme esse sistema cresce, aumenta a necessidade da seleção do
conteúdo...
Cerf
-- Com a World Wide Web, Tim Berners-Lee [desenvolvedor da
web que conhecemos hoje] criou uma avalanche de informações na rede de
computadores. Muitas delas são realmente úteis, enquanto outras não valem nada.
No entanto, fico feliz quando realizo uma busca e consigo encontrar aquilo que
procuro. Ainda fico surpreso quando acho algo em particular e vejo que alguém
se deu ao trabalho de colocar aquela informação na internet. A Wikipedia é um
bom exemplo disso, apesar de eles terem criado uma ferramenta para moderar
conteúdo, porque as pessoas mudavam dados dos quais discordavam. A quantidade
de informação que está sendo trocada na internet é absurdamente benéfica.
G1
-- Falando em colaboração, gostaria que o senhor comentasse o fenômeno das
redes sociais, como MySpace e Orkut, que mantêm uma quantidade enorme de
pessoas conectadas.
Cerf -- É um fenômeno muito interessante, que representa o que a
internet tem de melhor: reunir as pessoas em grupo para elas dividirem os
interesses que têm em comum. Sites como o MySpace e o Facebook são
desenvolvidos para que os usuários compartilhem informações sobre elas mesmas,
seus interesses ou o que elas vêm fazendo. Mas esse tipo de cultura tem um
futuro imprevisível, porque os jovens de hoje são muito abertos à idéia de
trocar informações. Conforme eles forem ficando mais velhos, podem se
arrepender de ter colocado seus pensamentos jovens na internet. E esses dados
podem nunca mais desaparecer, mesmo se forem retirados dos sites originais.
Pode ser um problema de geração, e os jovens provavelmente vão aprender que
deveriam pensar com mais cuidado sobre o que tornam público. Futuramente, as
pessoas vão perceber que deveriam ter guardado certas informações para elas.
Elas não pensam no fato de que, quando algo está no computador, pode ser
reproduzido e distribuído. Conforme o tempo for passando, as pessoas vão
aprender a lidar com os efeitos colaterais do uso da internet.
G1
– Um estudo recente mostra que 43% dos internautas ligados a redes sociais
consideram seus contatosvirtuais tão importantes quanto os reais. O que o senhor acha disso?
Cerf
-- Bom, eles são pessoas reais de todo jeito (risos). O fato
de você interagir com pessoas no universo virtual não significa que elas não
sejam reais. Mesmo nos jogos de RPG on-line [nos quais usuários controlam
personagens que interagem], trata-se de pessoas reais atrás de avatares. Existe
uma preocupação procedente de que as pessoas podem se envolver tanto com
o ambiente virtual que prefiram esta alternativa ao mundo real. Mas estamos
falando dos extremos. No geral, não vejo esses jogos on-line como mais perigosos
do que os de tabuleiro ou brincadeiras em que as crianças se vestem com as
roupas dos pais.
G1
-- A última pergunta, porque não há como fugir dela: qual será o futuro da
internet?
Cerf
-- Mais mobilidade, mais banda larga e vamos sair do
planeta, construindo uma rede interplanetária. .
Fonte: G1
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